Mensagem Quaresmal do Grupo Coordenador do Movimento de Romeiros de São Miguel

A todos os irmãos Romeiros de S. Miguel.


Queridos irmãos,
Chegamos à Quaresma, tempo forte e áureo da religiosidade cristã, que, para nós irmãos romeiros, é de particular relevo, importância e devoção ao culto da sagrada Vida, Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo.
É a mágoa, o vazio, a tristeza, a desolação e o desalento que todos sentimos por, mais uma vez, não sairmos em romaria e enchermos os caminhos da ilha do Arcanjo com preces, orações e cânticos que revela que, por mais adversidades que possam existir, o Movimento dos Romeiros de S. Miguel está mais vivo e forte que nunca.
O Grupo Coordenador do MRSM, como é hábito e não podia deixar de ser, partilha deste mesmo sentimento de angústia e quer, por isso, deixar a todo e qualquer irmão romeiro um sentido abraço de conforto e de amparo pelo desgosto acutilante desta reiterada ausência das nossas tão queridas romarias quaresmais, particularmente neste ano marcante em que se recorda o início dessa tradição há 500 anos.
As nossas romarias são, de facto, santuários a céu aberto, vias-sacras de luz e uma verdadeira teologia dos afetos, que muita falta nos fazem e carência nos deixam a nós romeiros, mas também às nossas comunidades e a todos os batizados em Cristo, das diversas paróquias da ilha de S. Miguel, que constituem toda uma assembleia orante e o verdadeiro Povo de Deus, que nas semanas da Quaresma se une aos Romeiros em oração e penitência, na misericórdia do Pai.
Como é sabido, em 2022, as romarias foram, novamente, suspensas, desta feita, por decisão dos próprios ranchos, não unânime, mas por maioria alargada, em Assembleia-Geral Extraordinária do Movimento de Romeiros de São Miguel. A vontade de que as romarias se realizassem era notória em todos os representantes dos ranchos, mas também era evidente o enorme sentido de responsabilidade, preocupação e amor pelo próximo e pelo bem-estar de toda a população da nossa ilha do Arcanjo que norteou e acabou por determinar a atuação dos ranchos nesta decisão. O “Não sair em Romaria” foi, de facto, uma decisão dificílima de tomar.
Porém, aquela distância, e tendo em conta todas as previsões, a posição não podia ter sido outra e não decidir naquele momento seria adiar uma decisão que todos sabíamos ter que ser tomada no futuro. Infelizmente, esta medida que a todos entristece e causa imensa dor, foi a mais adequada dado os acontecimentos que depois todos testemunhamos e a evolução do estado da pandemia, que se fez e ainda se faz sentir, e todo o contexto de saúde pública na nossa ilha, com transmissão comunitária e, muitas vezes, mais de 500 novas infeções de Covid-19 num só dia.
Assim, apesar do sentimento de profunda tristeza, devemos orgulharmo-nos por, simultaneamente, termos cumprido o nosso dever de cidadania, grande humanidade e de responsabilidade.
Contudo, há muito que se pode e deve fazer para viver a Quaresma imbuídos de um verdadeiro espírito de cristandade e da essência do que é ser Romeiro. Há um vasto leque de atividades que se posicionam entre o nada fazer e o colocar, propriamente, os pés a caminho e todo um rancho de romeiros na estrada, formado, com o xaile, lenço, sovadeira, bordão e terço, por um
ou mais dias, a caminhar, de freguesia em freguesia, a visitar igreja a igreja, ainda que isolados, em bolha, e com as precauções e seguranças que, por mais que achemos que são as adequadas, poderão não ser as suficientes e convenientes.
A prática de atividades de natureza digital, usufruindo das redes sociais e demais plataformas informáticas, por exemplo, pode ser uma das formas de manifestação da fé que, através do contato virtual, resulte numa verdadeira vivência da Quaresma, nestes tempos atípicos, num verdadeiro espírito de irmandade e fraternidade cristã.
Como forma de contribuir para as sugeridas atividades digitais, o MRSM, através do nosso guia espiritual, Pe. David Barcelos, enviará uma meditação/reflexão para cada Domingo da Quaresma que poderá incidir sobre o evangelho do dia, acreditando que, desta forma, se estará a promover um verdadeiro espírito de irmandade entre todos os romeiros que estarão a meditar sobre um mesmo texto. A meditação para o 1.º Domingo da Quaresma segue já em anexo a este e-mail.
Outras iniciativas poderão também ser concretizadas, mediante o engenho e imaginação de cada rancho, desde que com elas não se banalize nem descontextualize aquilo que compete a todos nós defender e preservar, as nossas sagradas Romarias Quaresmais.
A tradição é, foi e sempre será Romarias de uma semana em contato próximo com as populações e com a comunidade, não nos competindo a nós a dissociar esta vertente e vivência única e característica da romaria e, aproximarmo-nos, assim, do egoísmo, privando os demais fiéis desses contatos tão belos e únicos. Tudo o que não cumprir na integra estes e outros tão singulares preceitos é menorizar e desvirtuar um costume tão único, tão característico e tão específico que só uma tradição com 500 anos de existência consegue produzir.
Relembremo-nos que há caminhos sinuosos e passos que não devem ser dados sob o risco de serem irreversíveis. Não abramos precedentes complicados e sensíveis.
Recordemo-nos que o que foi acertado na já referida assembleia, por larga maioria e com a significativa presença dos mestres de romeiros dos diversos ranchos da ilha, foi que as romarias, no seu formato físico, não iriam ser postas em prática, assumindo todos nós este compromisso e entendimento.
Importa ainda referir que existe um regulamento que norteia toda a atuação do Romeiro. Esse mesmo regulamento faz referência clara a uma semana de caminhada, não a um dia.
O mesmo regulamente refere que a escolha dos mestres dos ranchos deverá recair em paroquianos, cristãos conscientes, piedosos, humildes, zelosos e cumpridores das suas obrigações de católicos, que tenham qualidades de liderança e chefia
É ainda referido que todos os romeiros deverão ser:
• Homens dotados do uso da razão, com capacidade para participar nos Sacramentos da Penitência e da Eucaristia e que habitualmente procuram cumprir os Mandamentos da Lei de Deus e da Santa Igreja.
• Homens com espírito de obediência para aceitar e cumprir as normas do Regulamento e as que lhes forem determinadas pelos responsáveis, bem como com saúde suficiente para poderem fazer a caminhada.
É verdade que todos nós queremos sentir a bênção de Deus que são as Romarias e que é a partilha com os nossos irmãos, mas não devemos com isso ceder a ímpetos autónomos e independentes, desgarrados do todo que é o MRSM.
A unidade e a coesão devem ser a palavra de ordem, devendo os ranchos agir em conformidade com os consensos conseguidos nos nossos debates plenários, norteando a sua atividade de acordo com princípios comuns e sobre um mesmo fio condutor e linha orientadora. Qualquer resquício de fragmentação que possa existir deve ser combatido e eliminado. Haja paz, tolerância e aceitação, particularmente no interior do nosso querido Movimento de Romeiros de S. Miguel que deve pautar pelo bom exemplo em toda a sua atuação. Evitemos as iniciativas dissidentes e desviantes.
Não aceitar o anteriormente exposto é viver na anarquia e à revelia, completamente à margem do verdadeiro espírito do que é ser romeiro.
Há que demostrar coesão e unidade, revelando o verdadeiro espírito do que é ser irmão romeiro, batizado, cristão dotado do espírito de obediência, sacrifício, bom senso, razão, amor ao próximo em prol de um bem maior e de uma causa comum.
É, precisamente, para que quando voltemos a pôr os pés na estrada as coisas sejam tal qual como eram antes desta interrupção nas romarias que não devemos, no entretanto, promover romagens alteradas e desprovidas da mística que é uma semana de caminhada em comunhão com todas as comunidades cristãs da nossa ilha e com todo o povo de Deus. Não há romaria sem o contato com os irmãos que nos solicitam a sua prece, que nos acolhem em suas casas e, principalmente, sem os afetos que se partilham, livre e desinteressadamente, naqueles momentos tão únicos que todos temos por hábito vivenciar nas semanas da Quaresma.
Um passo em frente, ainda que dotado da melhor das intenções, pode ser um passo em vão ou em falso, um retrocesso, e o que agora pode parecer correto pode, também, comprometer o futuro das nossas romarias nos moldes como foram praticadas até então e que são os verdadeiros e característicos, fiéis à essência das mesmas.
Não tenhamos atividades semelhantes às romarias femininas que, embora imbuídas da mesma intenção, são em tudo díspares, constituindo-se uma realidade distinta, como todos sabemos, ainda para mais quando muitas romarias femininas estão a suspender as suas peregrinações de um dia em simpatia e solidariedade para connosco. Sempre apregoamos que as nossas romarias eram diferentes das femininas, e são-no efetivamente, e neste momento em que até algumas das romarias femininas estão a ser canceladas vamos nós promover algo semelhante?
Atentemos também na nota pastoral para esta Quaresma do nosso Administrador Diocesano, Cónego Hélder Fonseca Mendes, que refere que “Ficam por realizar este ano dois sinais expressivos, as procissões penitenciais e as romarias quaresmais.” Mensagem mais clara que esta é impossível.
As nossas romarias quaresmais são uma Caminhada de Fé de oito dias (que começa muito antes de irmos para a estrada), com uma dinâmica muito própria, bem conhecida de todos nós, que não pode, nem deve ser condensada numas horas de caminhada, ou seja, sem pernoita, com as refeições apenas na sovadeira e, portanto, sem contactos (ou então com contactos mínimos com distanciamento social) com as comunidades de batizados, ou não, da ilha de São Miguel. Esta é, sem dúvida, uma das mais ricas e importantes vivências da Romaria Quaresmal, da qual não nos podemos nunca apartar.
Uma aparente bolha de vacinados e testados, muito provavelmente de máscara, até porque é obrigatório o uso de máscara para frequentar espaços fechados como igrejas, por exemplo,
isolados sobre si no seu “casulo”, ainda que rezando pela comunidade, não proporcionará uma comunhão efetiva com a população.
A comunhão com a(s) comunidade(s) é um dos aspetos fundamentais da Romaria Quaresmal na ilha de São Miguel. Nesse aspeto temos que, necessariamente, estar todos de acordo.
A concretizarem-se essas caminhadas de um dia nos tempos que correm de Pandemia, mesmo caminhando numa pertença bolha sanitária revelará falta de responsabilidade e de unidade deste grupo de Romeiros, batizados, que todos nós somos.
Sabemos que é com a melhor das intenções que se sugere e deseja que este ano haja pelo menos um dia de Romaria Quaresmal (se é que podemos chamar a tal Romaria Quaresmal). Contudo, por mais sedentos que estejamos (e estamos) dos nossos oito dias de caminhada e de voltarmos a vivenciar uma amostra do Reino de Deus (logo termos uma experiência vital de Deus), por mais que tenhamos para pedir (e temos, muito), assim como para agradecer ao Senhor nosso Deus, a realização desta amostra de romaria não pode ser uma ação egotista e egoísta da nossa parte, além de que não será uma forma de inovar as Romarias Quaresmais, nem manter viva a tradição secular das mesmas, será sim, pelo contrário, desvirtuar essa tradição, para além de podermos ser os causadores de um problema adicional de Saúde Pública, mesmo na atual situação pandémica e com todos os cuidados devidos, por mais zelosos que sejamos.
Recordemo-nos que, mesmo num dia só, em cada uma das semanas da Quaresma ou da Semana Santa, seriam muitos homens na rua o que geraria necessariamente um aglomerado de pessoas.
O argumento de que este é o terceiro ano de Pandemia sem irmos para a estrada e que se não formos as Romarias Quaresmais de São Miguel vão definhar, não é válido, até porque houve no passado alturas em que os ranchos não saíram e as Romarias ainda cá estão, mais vivas que nunca, como referimos inicialmente, dado a constatação da imensa vontade que existe pela generalidade dos Romeiros de as pôr em prática e de caminhar orando.
Também não adianta pensar que é algo imperdível caminhar no ano dos alegados 500 anos das Romarias Quaresmais de São Miguel. Podemos bem celebrar este começo da Caminhada em Romaria noutra altura qualquer, até porque, na quarta-feira a seguir ao dia 22 de Outubro de 1522, apenas foi semeado um grão de mostarda, que primeiro foi germinando com dor, foi florescendo em tempos atribulados, foi por vezes bem cuidado, outras vezes mal cuidado e teve até alturas em que ninguém o cuidou, mas que, mesmo assim, foi crescendo e ficando forte para dar uma das árvores mais frondosas do horto, sentindo todos nós a extrema carência de nos sentarmos à sua sombra e, por isso, querermos tanto caminhar e ir para a estrada em Romaria e em irmandade.
Devemos, por tudo isso, ser responsáveis, pacientes e consistentes, em prol de algo que é muito maior que todos nós e que permanecerá, se Deus quiser, tendo todos nós já partido para o Reino do Pai.
Inovar neste tempo difícil, em que temos tanto para agradecer e para pedir, não passa por ir para a estrada a toda a força amputando aspetos maravilhosos e fundamentais da nossa Romaria Quaresmal.
Inovar neste Tempo que vivemos é por exemplo cada Rancho procurar fazer, como souber e puder, pelo menos na Semana da Romaria algo que mantenha os irmãos unidos e o fogo vivo, aquele que nos deve consumir em amor pelo outro, tal como alguns ranchos fizeram acontecer em anos transatos.
Como é do conhecimento geral, e de acordo com as posições adotadas pelos mestres na já referida assembleia, existe uma maioria significativa que discorda de qualquer manifestação física das Romarias na estrada este ano de 2022, o que não é sinónimo de menor apreço e respeito pelas nossas Romarias, antes pelo contrário, é sinal de zelo, dedicação e cuidado extremoso.
Vamos, todos, acatar e respeitar a decisão tomada assegurando que as nossas Romarias Quaresmais, ao saírem para a estrada, acontecerão com a devida solenidade, profundidade e dignidade que tanto merecem.
Não consintamos que a discórdia, desunião, dissidência, desentendimento e ausência de consenso pautem a ação deste Movimento que é de todos nós. É por isso que exortamos e apelamos à vossa consciência cristã e ao vosso espírito de verdadeiros romeiros quaresmais pela unidade, pela coesão, pelo consenso e pelo bom entendimento e articulação de toda a nossa atuação e atividades.
Sejamos todos zelosos, sensatos e prudentes como o Bom Pastor. Sejamos um movimento uno, como um só corpo, em Cristo Jesus.
As nossas Romarias Quaresmais, na sua plenitude, verdadeira essência e por inteiro, são algo tão único, tão espiritual, tão belo, tão transcendente e tão reparador, que não nos digno a nós alterar, uma vez que seja.
Não dissociemos o indissociável! É este o nosso dever para com esta tradição secular, tão querida de todos nós.
Na Quaresma de 2023, com grande expectativa e ânimo, o cântico suave e dolente da Ave-maria, com todas as especificidades e caraterísticas que o embelezam, voltará a fazer-se sentir nas ruas, vales e veredas da nossa ilha de São Miguel.
Seja para sempre Louvada a sagrada Vida, Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo!
Uma Santa Quaresma a todos os Irmãos.


O Grupo Coordenador e o Guia Espiritual
5 de março de 2022

Movimento apela a que não se realizem romarias de um dia

Açoriano Oriental: 03 de março de 2022

No jornal Açoriano Oriental, desta quinta-feira, dia 3 de Março de 2022, o Grupo Coordenador do MRSM apela à unidade e exorta a que não se desvirtuem as tão valiosas Romarias Quaresmais de S. Miguel, caracterizadas por especificidades e particularidades tão únicas e por uma vasta, valiosa e exclusiva história, tradição e legado.

Seja bendita e louvada a sagrada Vida, Paixão, Morte e Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo!

«TERÇO PELA PAZ 2021» DOMINGO | 14 NOVEMBRO | 15h | MONTE DA PAZ

Inserido na Festa de Nossa Senhora da Paz e na “TRILOGIA DOS 500 ANOS”, os Ranchos de Romeiros da nossa Ouvidoria de Vila Franca dos Campo (Ponta Garça, Ribeira das Tainhas, Matriz de Vila Franca e Água d’alto) em conjunto com o Movimento de Romeiros de São Miguel, unem-se novamente para rezarem pela Paz e pelo fim desta Pandemia.

Toda a “FAMÍLIA ROMEIROS” está convidada a rezar connosco!

Um abraço em Cristo,

Ir. Carlos Vieira

NB: Os irmãos romeiros deverão fazer-se acompanhar do seu LENÇO, do seu TERÇO e da sua MÁSCARA.