No passado dia 3 de dezembro, o Movimento dos Romeiros de São Miguel esteve em Roma. Embora só tenham estado fisicamente dois elementos do grupo coordenador, a verdade é que quando o Papa Francisco se nos dirigiu, “aos peregrinos de língua portuguesa”, referindo especificamente os “membros das Romarias Quaresmais de São Miguel, uma ilha dos Açores”, não foram só os irmãos Ildeberto Garcia e João Carlos, a serem nomeados. Foram todos os irmãos romeiros que, durante todo o ano, rezam e procuram o rosto de Deus, com especial incidência no período da Quaresma. Foi a todos eles que o papa Francisco cumprimentou, agradecendo esta peregrinação e todas as outras que habitualmente os romeiros fazem.
Independentemente de termos feito uma ou 50 romarias, ouvir uma referência aos Romeiros de São Miguel pela voz do Papa, na Praça de São Pedro, no Vaticano, em alto e bom som para o mundo inteiro, é algo que jamais este movimento poderá esquecer. Como estão recordados, no último retiro que fizemos antes da Quaresma, na Escola Secundária da Ribeira Grande, o senhor Bispo lançou uma semente: o Papa Francisco exorta-nos permanentemente a sermos missionários, a sermos evangelizadores, a sairmos do Templo, indo ao encontro do outro e isto é o que os romeiros fazem. “Vou escrever uma carta ao Santo Padre a dar-lhe conta de que há cerca de 500 anos, em São Miguel, há já grupos de homens que saem à rua para rezar, em penitência”.
Se bem o pensou melhor o fez e a resposta não tardou.
Quando iniciamos as romarias quaresmais já tínhamos uma indicação do prelado para orarmos pelo Santo Padre, como aliás sempre fazemos, mas, desta vez, D. António pediu mais. Que nenhum rancho se esquecesse de rezar em intenção do Santo Padre, pedir por ele. Afinal, o mote do seu pontificado tinha ficado marcado pela necessidade de espalhar a Alegria do Evangelho, e isso é a essência do nosso movimento.
O Bispo de Angra queria que o Santo Padre soubesse que nos Açores muita gente já fazia isso.
Dois meses de volta, na caixa do correio, lá estava a missiva do Vaticano, a acusar a receção da carta enviada por D. António e o reconhecimento da importância destas romarias para sedimentar a fé entre os homens.
As romarias que levaram à estrada 56 ranchos, onde couberam 2452 romeiros, e as famílias de todos eles, os amigos e cada um que se nos dirigiu, não podiam ter respondido de forma mais positiva a este desafio proposto pelo Bispo de Angra, e não houve um só romeiro que durante os sete dias da semana não tivesse feito uma oração em intenção de Francisco.
Perante tanta generosidade e tanto entusiasmo, surgiu a ideia de enviar ao Papa um ramalhete espiritual, com um número aproximado de orações e, sobretudo, com um enquadramento do que é o movimento, do que são as romarias quaresmais, como se desenrolam no espaço e no tempo e quem participa nelas, sendo que o passo seguinte era entregar diretamente ao Santo Padre esta missiva. Parecia uma utopia, algo intangível, coisa para outros e não para os romeiros, homens de bolsos vazios, despojados de tudo, menos dessa sede de seguir Jesus.
Esta peregrinação parecia até mais difícil do que a nossa Romaria. Mas depois de devidamente amadurecida, ponderada e refletida, lá fomos. De um momento para o outro, como os primeiros cristãos quando deixaram de poder peregrinar à Terra Santa e começaram a peregrinar a Roma, cabeça da Cristandade.
Esta ida foi, pois, um regresso às origens.
A intercessão de Nossa Senhora foi decisiva para alcançar este objetivo. É verdade que contávamos com o empenho pessoal do Senhor Bispo e também na Cúria Romana, com Monsenhor Bettencourt, ele próprio romeiro, duas peças essenciais desta nossa peregrinação. Sem eles, não teríamos conseguido o que quer que fosse. Mas a nossa ida a Roma traz-nos outras responsabilidades que se traduzem no aprofundamento da comunhão entre este movimento e a Igreja Universal.
O que fizemos em intenção do Santo Padre é o que fazemos diariamente por todos: agradecer, louvar e rezar a Deus, procurando-nos n’Ele e obtendo d’Ele as respostas de que necessitamos.
Há um sonho do qual nunca podemos desistir: o sonho de que cada um de nós, na sua paróquia, na sua comunidade, na sua família, saiba ser verdadeiramente romeiro. Saiba caminhar pela estrada, sem nenhuma pressão exterior, que se entregue ao outro e se alimente da fé, não para enganar a fome, mas deixando que a alma se alimente e se revitalize: no silêncio e na palavra, no encontro e no dom, na escuta e na prece.
No fundo, o que esta peregrinação a Roma nos vem dizer é que devemos continuar a ser peregrinos, cada vez mais experimentados e mais reconciliados com o que é decisivo, um pouco na linha de Isaías (Is 65,1): “Eu fiz-me ouvir junto de quem não perguntou por mim, deixei-me achar por quem não me buscou”. Peguemos, por isso, naquela sugestão que Jesus faz aos discípulos, mais do que uma vez: “passemos para a outra margem” (Mc 4,35).
Vamos continuar a ser romeiros!