Os fios dos xailes dos Romeiros

Desde que os romeiros são romeiros que dos seus xailes caiem fios no chão das estradas, igrejas e casas por onde passam. Um pormenor, sem a mínima importância, que este ano me fez refletir e rezar.

Não houve dia, em que eu não encontrasse um ou mais fios dos xailes destes irmãos na fé que estavam em peregrinação quaresmal. Nos mais díspares e distantes lugares, da nossa ilha, encontrei-me com um silencioso e recatado rasto de fé.

Cada fio falava-me de uma vida, de várias vidas confiadas a Deus durante aqueles dias. No meu coração e mente, fiz de todos eles um novelo de oração, penitencia e partilha porque são destes fios que se fazem uma romaria. Quando chegou o momento de catalogar e guardar esta minha vivência quaresmal escolhi coloca-la no cesto dos Testemunhos. E porquê? Não por ser um dos muitos testemunhos de fé que a Igreja, povo de Deus, no anonimato dos seus fiéis me oferece continuamente, mas porque denunciavam a urgência e o modo como devemos testemunhar o Mestre dos mestres, Jesus Cristo.

Não há hora nem lugar determinado, todo o tempo e espaço é propício para darmos testemunho de Jesus. Não é dia sim, dia não. É em cada dia, na normalidade das nossas vidas, muitas vezes sem nos apercebermos, que as nossas palavras, gestos e escolhas são autênticos fios que marcam a diferença num quotidiano cada vez mais inferente ao amor a Deus e ao próximo.

A propósito, ainda trago na oração o adolescente do Paquistão, com apenas 14 anos, que na semana passada, não hesitou em afirmar-se cristão perante um grupo de adolescentes muçulmanos que responderam à sua coragem com a cobardia de o queimarem vivo. Nauman Masih deu a vida pelo Cordeiro de Deus que se imolou para nossa salvação. Sem dúvida, um mártir dos nossos dias.

Seria eu capaz? Não sei. Sinceramente… não sei! O fato é que nunca fui confrontado com tamanha adversidade, mas tenho a certeza de que perante outras adversidades que me desafiam igualmente a testemunhar Aquele que é a razão da minha fé, tenho que responder com a mesma ousadia e confiança, porque se não o fizer a minha adesão a Jesus será incompleta.

Perante esta certeza, Romeiros e não Romeiros, todos os cristãos, têm de dar razões da sua fé. Uma vez que o Reino de Deus tece-se com os fios, singelos e aparentemente insignificantes, de verdade, de justiça e do amor com que vamos marcando a nossa passagem, a nossa existência. Com estes fios não se fazem enredos, mas novelos, verdadeiramente, da vida real, que vale a pena seguir nos écrans da vida.

Pe. Nuno Maiato

diariodalagoa.com